Convida da Flip, ela diz que livros vivem fase de
‘renascimento’ como objeto
Trabalhando no galpão que fica no primeiro andar de sua
casa, numa área nobre de Amsterdã, a designer holandesa Irma Boom, de 55 anos,
parece fazer parte das páginas de um dos livros desenhados por ela: veste roupa
muito preta num cenário muito branco. Há todas as qualidades de papel em tons
claros espalhados pelo estúdio iluminado, o que dá algum volume a cena, mas o
ponto que concentra a atenção do ambiente é justamente o mais escuro – a figura
de Irma, com seu cabelo muito negro, as mangas compridas, a saia de comprimento
austero.
Umas das convidadas da Flip deste ano, onde vai ministrar
uma oficina para profissionais da área previamente selecionados, a designer de
livros é uma referência no mercado editorial internacional: ganhadora de
diversos prêmios, entre eles o Guttemberg Prize, uma espécie de Oscar
editorial, tem 40 dos seus livros integrando a MoMA, em Nova York. A procura por
sua oficina em Paraty foi tão grande que dois workshops extras estão sendo as
pressas em São Paulo, pós-Flip. A dias da viagem, ela parece curiosa pela
audiência, quase preocupada.
– É um evento
literário, e não falo do conteúdo dos meus livros. Basicamente, sobre a forma.
Não sei se esperam que eu vá ensine alguma coisa, eu vou apenas contar como
faço meu trabalho, e seria interessante ouvir como os designer brasileiros fazem
o seu. Vou propor que façamos um livro juntos, talvez um pequeno volume, de
oito páginas – diz Irma, que nunca esteve na América do Sule montou uma listas
de obras arquitetônicas que faz questão de conhecer, como as de Oscar Niemeyer.
– O importante em cada trabalho é a atitude que tem frente a ele: uma maneira
específica de se comportar em relação ao trabalho. As respostas às questões do
projeto estão dentro do próprio livro, mas só a atitude que você tem diante
dele vai leva-lo a elas.
Seu portefólio tem cerca de três centenas de livros
inteiramente concebidos por ela, e o que há de especial em cada um dele é o
casamento perfeito ente forma e conteúdo. Não são necessariamente, livros de
literatura: há muitos catálogos de museu, guias de arte, compilações de
eventos, enciclopédias de temas que vão de feminismo a ecologia. Todo detalhe
passa por um conceito: o tipo de papel, o corte, tipografia, cores, a maneira
como o livro vai ser lido, por quem, em qual momento, de que maneira pode ter
seu mecanismo explorado. A designer é uma co-autora dos livros que faz, apesar
de recusar veementemente o título de artista:
– Não sou artista,
sou uma designer. Trabalho a partir de encomendas, meus livros são feito em
escala industrial. Faco questão que tenham preços acessíveis. Arte é outra
coisa.
Enquanto fala, mostra exemplo s a partir de um pequeno livro
vermelho, do tamanho de uma caixa de fósforos, onde estão reunidas todas capas
dos livros que já fez, em miniatura. Os projetos que apresenta aos clientes são
feitos em maquetes como na arquitetura.
– Não uso PDFs, não
acredito em e-books. E-book não é livro. Lido com livros reais. Meu trabalho é
reinventar o objeto que ele seja uma nova forma de contar uma história. Um
livro, o que faz? Espalha informações. Meu trabalho é mostrar o que você pode
fazer a partir da ideia de “virar páginas”. Vou dar um exemplo: num livro, no
qual estou trabalhando, a tipografia fará parte do romance, a tipografia será um personagem . é um
desafio criar um livro desses, me encanta. Eu realmente acredito que os livros
vivem uma fase de renascimento – afirma.
O entusiasmo de Irma em relação ao objeto, no entanto, não é
mesmo em relação às instituições que os protegem e divulgam, como bibliotecas e
livrarias. Irma diz comprar pouquíssimos livros, e conta que sempre tira um de
casa quando compra um novo.
– Numa biblioteca,
os livros continuam não chamando atenção se disputados com o computador.
Acredito mais em pequenas coleções de livros especializados, disponíveis em
lugares estratégicos – comenta. – Sempre que vou a uma livraria me deprimo. É
tão difícil fazer livros; se alguém se propõe fazer um, que faça bem feito, e
não de qualquer jeito, como a maioria parece ter sido feita.
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