Um judeu de sete vidas no Rio
Rio - As cicatrizes são herança do Holocausto e de combates como oficial do exército israelense. A coragem e o otimismo são a lição que um judeu sobrevivente de sete campos de concentração tirou das adversidades.
A vida do taxista aposentado Alexandre Liberman, que faz 82 anos em outubro, é digna de filme. Polonês naturalizado brasileiro, enfrentou, desde a infância, a perda da família, morta em campos nazistas de extermínio, e a angústia do cárcere por cinco anos.
Mesmo com tanto sofrimento, carrega o bom humor: “Temos que encarar a vida. Não dá para ficar chorando”, diz, sorrindo. Aos 9 anos, perdeu pai e tio, levados por alemães para Treblinka, campo de extermínio judeu na Polônia, onde foram guilhotinados.
Nesse ano de 1939, Alexandre, a mãe e três irmãos — de 7 e 3 anos e uma de 6 meses — se esconderam no sótão da casa. Descobertos, foram capturados.
“Estava na fila para morrer e vi jogarem minha irmã de 6 meses para o alto e atirarem nela. Disse à minha mãe: ‘Não vou entregar minha cabeça’. Corri em meio a tiros”, relata.
Na fuga, foi baleado no abdome e se uniu a outros fugitivos na floresta. Muitas vezes, escapavam escondendo-se em cima de árvores.
Aprendeu a atirar e, por falar bem polonês, foi escolhido pelo grupo para fazer compras na cidade. Numa ida, foi descoberto: “Perguntaram se eu era judeu e eu neguei. Até que baixaram minha calça”.
Trabalho como proteção
Dali, foi levado para o campo de Budzin, na Polônia. “Fui escolhido várias vezes para morrer. Mas me escondia entre o monte de judeus”. Depois foi para o de Majdaneck — “o pior, havia sete crematórios” — e mais tarde para o Birkenau, em Auschwitz, onde foi marcado com o nº A181534.
Já no campo Laurahutte, dedicou-se ao trabalho e passou a ser protegido por engenheiro alemão. “Se precisassem do meu trabalho, não me matariam. E ele gostava de mim e me dava comida”. Depois foi levado para Mauthasen-Gusen (Áustria) e Dachau (Alemanha).
Em 1945, fim da guerra, na Bósnia, foi resgatado por russos. Impressionados com seu estado precário de saúde, os oficiais o levaram à Rússia, onde conheceu Stalin.
“Pedi à Cruz Vermelha para voltar à Polônia”. Em dois anos, aprendeu táticas de guerra com grupos israelenses e embarcou no Navio Exodus, para Israel, mas foi preso por britânicos em Chipre. Libertado, lutou pela independência de Israel por cinco anos. “Venci a batalha no Egito”, orgulha-se
Aos 18 , foi atingido por estilhaços de granadas e perdeu a audição do ouvido esquerdo. Aos 28, veio ao Brasil em busca de trabalho, deixando no Velho Continente mulher e duas filhas. Aqui, foi camelô, comerciante e por mais de 40 anos, taxista.
Casou-se e teve mais dois filhos. Ao volante no Rio, sobreviveu a dois assaltos. Em um, injetaram-lhe gasolina. Hoje, o ex-combatente quer sossego: “Já vivi muito. Gosto de ler notícias, jogar no computador. Quero fazer curso de informática”.
Fonte: O Dia